O juiz Afif Jorge Simões Neto, que ficou conhecido por causa de um voto em verso no Rio Grande do Sul em 2009, elogiou o ato do delegado Reinaldo Lobo, da 29ª DP de Riacho Fundo (18 quilômetros de Brasília), que surpreendeu ao registrar, no último dia 26 de julho, um crime em forma de poesia. “É para quem tem dom”, disse o magistrado ao G1.
O delegado apresentou uma poesia no meio de um inquérito de crime de receptação. A peça final não foi aprovada pela Corregedoria da Polícia Civil e terá de ser refeita dentro dos padrões.
"O preso pediu desculpa
disse que não tinha culpa
pois estava só na garupa
foi checada a situação
ele é mesmo sem noção
estava preso na domiciliar
não conseguiu mais se explicar”, diz um dos trechos escritos pelo delegado. O caso foi revelado nesta quarta-feira (3).
No caso do juiz, o voto foi apresentado a dois outros magistrados da 2ª Turma Recursal Cível do RS, e virou decisão final, sem direito a recurso.
Na ação, Simões Neto negou danos morais a um patrão, como são chamadas as autoridades dos Centros de Tradições Gaúchas, que se sentiu ofendido após ter sido acusado por um conselheiro de não prestar contas corretamente. Em primeira instância, o conselheiro foi condenado a pagar R$ 1,5 mil e, no julgamento do recurso, como relator, Simões escreveu em um poema afirmando que a ofensa não aconteceu.
"Não é um fato comum, é inusitado. Não é toda hora que aparece um voto em verso”, diz o juiz, que afirma ter se inspirado nas peças escritas pelo pai, que defendia réus em processos criminais em forma de verso. “Não vejo nenhum problema. Esse mundo está muito burocratizado. As coisas não precisam ser iguais a cem anos atrás. É para quem tem dom, não é para todos”, afirma.
“Nesse meu caso, a parte não entendeu um verso e aí eu respondi e acrescentei mais uma estrofe para que ele entendesse melhor”, complementa o magistrado. “Não houve censura e nem rejeição por parte dos colegas.”
Ainda na opinião do juiz, “não se pode castrar uma manifestação intelectual que não denigre o relatório”. “Desde que tenha os pressupostos legais, [o relatório com poema] deve perdurar, e não deve ser motivo de crítica. Principalmente porque é uma manifestação cultural, intelectual.”
Simões diz ainda que aquele foi seu último voto em verso e prefere não ser chamado de poeta. “Eu queria até saber como fez esse delegado. Ouvi dizer que ele demorou uma hora para escrever. Eu demorei mais. Tem que pensar, formatar o verso, adequar a rima. É como se fosse a letra de uma música”, diz. “Essa manifestação literária, desde que não agrida os pressupostos da lei, não precisa ser raivosamente combatida. Nunca sofri nenhuma rejeição.”
Para o magistrado, no entanto, não é qualquer caso que pode terminar em poesia. Até hoje, seu único voto em verso foi o de 2009. “Tem que ser bom”, diz.
Veja a seguir a íntegra dos versos escritos pelo juiz no voto de 2009:
"Este é mais um processo
Daqueles de dano moral
O autor se diz ofendido
Na Câmara e no jornal.
Numa festa sem fronteiras
Teve início a brigantina
Tudo porque não dançou
O Rincão da Carolina.
Já tinha ouvido falar
Do Grupo da Pitangueira
Dançam chula com a lança
Ou até cobra cruzeira.
Houve ato de repúdio
E o réu falou sem rabisco
Criticando da tribuna
O jeitão do Rui Francisco
Tem CD dentro nos autos
Que ouvi bem devagar
E não encontrei a calúnia
Nas palavras do Wilmar.
Que o autor não presta conta
Nunca disse o demandado
Errou feio o jornalista
Ao inventar o fraseado.
Julgar briga de patrão
É coisa que não me apraza
O que me preocupa, isso sim
São as bombas lá em Gaza.
Ausente a prova do fato
Reformo a sentença guerreada
Rogando aos nobres colegas
Que me acompanhem na estrada
Sem culpa no proceder
Não condeno um inocente
Pois todo o mal que se faz
Um dia volta pra gente.
Decidir o que escancara
Independe de talento
Tanto aqui como em Rivera
E Santana do Livramento.
E fica aqui um pedido
Lançado nos estertores
Que a paz volte ao seu trilho
Na terra do velho Flores."
O delegado apresentou uma poesia no meio de um inquérito de crime de receptação. A peça final não foi aprovada pela Corregedoria da Polícia Civil e terá de ser refeita dentro dos padrões.
"O preso pediu desculpa
disse que não tinha culpa
pois estava só na garupa
foi checada a situação
ele é mesmo sem noção
estava preso na domiciliar
não conseguiu mais se explicar”, diz um dos trechos escritos pelo delegado. O caso foi revelado nesta quarta-feira (3).
No caso do juiz, o voto foi apresentado a dois outros magistrados da 2ª Turma Recursal Cível do RS, e virou decisão final, sem direito a recurso.
Na ação, Simões Neto negou danos morais a um patrão, como são chamadas as autoridades dos Centros de Tradições Gaúchas, que se sentiu ofendido após ter sido acusado por um conselheiro de não prestar contas corretamente. Em primeira instância, o conselheiro foi condenado a pagar R$ 1,5 mil e, no julgamento do recurso, como relator, Simões escreveu em um poema afirmando que a ofensa não aconteceu.
"Não é um fato comum, é inusitado. Não é toda hora que aparece um voto em verso”, diz o juiz, que afirma ter se inspirado nas peças escritas pelo pai, que defendia réus em processos criminais em forma de verso. “Não vejo nenhum problema. Esse mundo está muito burocratizado. As coisas não precisam ser iguais a cem anos atrás. É para quem tem dom, não é para todos”, afirma.
“Nesse meu caso, a parte não entendeu um verso e aí eu respondi e acrescentei mais uma estrofe para que ele entendesse melhor”, complementa o magistrado. “Não houve censura e nem rejeição por parte dos colegas.”
Ainda na opinião do juiz, “não se pode castrar uma manifestação intelectual que não denigre o relatório”. “Desde que tenha os pressupostos legais, [o relatório com poema] deve perdurar, e não deve ser motivo de crítica. Principalmente porque é uma manifestação cultural, intelectual.”
Simões diz ainda que aquele foi seu último voto em verso e prefere não ser chamado de poeta. “Eu queria até saber como fez esse delegado. Ouvi dizer que ele demorou uma hora para escrever. Eu demorei mais. Tem que pensar, formatar o verso, adequar a rima. É como se fosse a letra de uma música”, diz. “Essa manifestação literária, desde que não agrida os pressupostos da lei, não precisa ser raivosamente combatida. Nunca sofri nenhuma rejeição.”
Para o magistrado, no entanto, não é qualquer caso que pode terminar em poesia. Até hoje, seu único voto em verso foi o de 2009. “Tem que ser bom”, diz.
Veja a seguir a íntegra dos versos escritos pelo juiz no voto de 2009:
"Este é mais um processo
Daqueles de dano moral
O autor se diz ofendido
Na Câmara e no jornal.
Numa festa sem fronteiras
Teve início a brigantina
Tudo porque não dançou
O Rincão da Carolina.
Já tinha ouvido falar
Do Grupo da Pitangueira
Dançam chula com a lança
Ou até cobra cruzeira.
Houve ato de repúdio
E o réu falou sem rabisco
Criticando da tribuna
O jeitão do Rui Francisco
Tem CD dentro nos autos
Que ouvi bem devagar
E não encontrei a calúnia
Nas palavras do Wilmar.
Que o autor não presta conta
Nunca disse o demandado
Errou feio o jornalista
Ao inventar o fraseado.
Julgar briga de patrão
É coisa que não me apraza
O que me preocupa, isso sim
São as bombas lá em Gaza.
Ausente a prova do fato
Reformo a sentença guerreada
Rogando aos nobres colegas
Que me acompanhem na estrada
Sem culpa no proceder
Não condeno um inocente
Pois todo o mal que se faz
Um dia volta pra gente.
Decidir o que escancara
Independe de talento
Tanto aqui como em Rivera
E Santana do Livramento.
E fica aqui um pedido
Lançado nos estertores
Que a paz volte ao seu trilho
Na terra do velho Flores."
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